quinta-feira, 7 de maio de 2015

Daquilo Que Se chama Mágoa


A mágoa:
Mágoa é aquilo que tampa seus olhos. Impede sua respiração.
A mágoa te segura na hora de um riso frouxo. Na hora de construir planos.
Você fica impermeável.
Nada te toca.
Nada te transpassa.
Nem chuva, nem sol.
Você quer observar a lua com alguém ao lado... mas esse alguém nunca está lá.
Você se habitua a ser sozinho. A ser descrente.
A mágoa te fragiliza. E quanto mais frágil, mais suscetível fica a contrair mais mágoas.
Às vezes é só um aluno desaforado. Às vezes é o vizinho do lado.
As vezes pode ser um amigo casado. As vezes pode ser só o seu coração desacelerado.
Mas a mágoa está ali... como se fosse uma entidade pronta a possuir seu corpo.
Você até pensa no monte de remédios da sua mãe... pensa em tomá-los, em se suicidar, porque viver se tornou indigesto.
Mas morrer te levaria aonde?  
À um inferno?
À um purgatório, quem sabe?
Ou talvez, à um céu...
E você faria o que lá? Viveria essa mesma mediocridade de hoje? Essa mesma sensação? Esse mesmo tédio?
Qual é a graça de um céu? De um inferno? De um julgamento?
Você está magoado, não está vivo há muito tempo.
Não lembra mais o sabor de um bom café, ou de um bom papo descontraído.
Você não tem mais a bússola de um caminho. Não se importa mais em defender uma causa, ou alguém. Está impermeável. Descrente em Deus, na vida, em suas escolhas.
Impermeável.
Você não absorve nada. Não consegue mais absorver, nem mesmo amor próprio.
Você está pior a cada dia.
O choro vem mais forte...
A compulsão alimentar também.
E você se torna gordo com tantas mágoas alimentares.
Sua obesidade te enterra ali mesmo, no meio da mesa.
Você morre... morbidamente, com sua obesidade mórbida.
Você sente dores... no pé, na coluna. Sua barriga está flácida, e seu cérebro também.
Tudo se tornou tão horrível, tão sem alma, que só comer faz de você uma pessoa menos infeliz. Você está magoado com a comida também. Mas você a quer mesmo assim.
E você se pergunta: é só isso mesmo? Pão todos os dias? Omelete todos os dias? Cadê o macarrão, mãe? Cadê o macarrão que eu tanto tenho pedido?
Mas o macarrão não vai resolver minha vida.
O macarrão não vai matar minha vontade de comer.
Porque Deus não se fez existir ainda...
Porque morrer ainda não é uma boa opção. Por que o que mais haverá depois? Mesmo se todos os remédios do armário, tomados de uma só vez, fossem fatal, o que poderia haver de tão extraordinário do outro lado?
E você sabe que não é o remédio o que você quer...
Talvez você queira só um abraço...
Ou um carinho.
Amor...
Na realidade, você nem sabe exatamente o que gostaria de ter. Ou querer. E nesse sentido, sua mãe tem razão quando diz “você não sabe o que quer...”
Todas as coisas não possuem mais o mesmo sentido para você. Então, laços familiares, amorosos, religiosos, ganham uma conotação diferente. E tudo, t-u-d-o... T – U – D - O! Vai para a lata do lixo nas horas mais entristecedoras...
E aí, você se magoa mais ainda com todos, com você, com Deus. Porque não houve cuidado, não houve proteção, não houve amor.
E você está jogado... despedaçado.

Magoado.


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